A endometriose é uma doença de caráter inflamatório caracterizada pela presença de tecido endometrial fora da cavidade uterina. E o que isso significa? Se olharmos do ponto de vista puramente biológico, o ciclo menstrual acontece para que, após a ovulação, ocorra a fecundação do óvulo que, nos 9 meses seguintes, irá se desenvolver em um feto que vai ser a representação da reprodução da espécie.
Mas para que esse processo aconteça com sucesso, o corpo da mulher prepara o ambiente uterino para suportar a gestação, um dos principais suportes para tal é o desenvolvimento do endométrio. O endométrio é a camada que reveste o útero e é estimulada, por ação principalmente da progesterona, a se proliferar a cada ciclo menstrual para formar uma “caminha” onde o feto poderá se desenvolver. Mas quando a fecundação não ocorre, essa camada é expelida na forma de menstruação.
Em algumas mulheres, porções desse tecido endometrial acabam se instalando em regiões que não a sua de origem - o útero - e nesses locais, principalmente na região pélvica e abdominal, se proliferam. Tal fato gera uma resposta do sistema imune, e a endometriose é marcada por elevada resposta inflamatória, que está muito relacionada a um dos principais sintomas da condição: a dor pélvica. Quanto mais exacerbada essa inflamação, mais lesões podem progredir, passando de estágios superficiais até fibroses, adesões, cistos e nódulos. A cólica menstrual intensa, dor durante a relação sexual e infertilidade são outros sintomas clássicos da condição.
A disbiose, comumente marcada pelo aumento de bactérias patogênicas na microbiota intestinal, acaba alterando a resposta imune, com elevação de citocinas pró inflamatórias, prejuízos a tolerância imunológica e alteração das células desse sistema, contribuindo para a característica patogênica principal da endometriose: a inflamação. Além disso, as lesões da endometriose respondem ao estrogênio: esse hormônio é capaz de estimular ainda mais a sua proliferação. E aqui entra outro importante ponto de contato entre a composição das bactérias do intestino e essa doença do trato reprodutivo feminino: o estroboloma.
Uma vez que o estrogênio - produzido principalmente nos ovários - entra na corrente sanguínea, passa pelo fígado, onde está sujeito a passar por um processo de conjugação que serve para inativar potenciais compostos tóxicos ao organismo e eliminá-los pelas fezes ou urina. Por mais que o objeto dessa metabolização sejam principalmente os xenobióticos, esse “controle” dos níveis de estrogênio ativos também é importante, principalmente quando existe uma condição hormônio dependente como a endometriose. No entanto, existem alguns microrganismos intestinais que são capazes de secretar enzimas chamadas β-glucuronidase, responsáveis por desconjugar o hormônio sexual feminino estrogênio, resultando na volta à sua forma ativa, que, entre outras atuações que exerce no corpo feminino, pode atuar na progressão das lesões endometrióticas.
Existe uma relação bastante complexa entre endometriose e disbiose, com dados que mostram que mulheres com endometriose apresentam microbiota alteradas e que essas alterações do perfil microbiano intestinal pioram o quadro da endometriose. Nesse cenário, padrões alimentares ricos em fibra e ômega 3, além de potencial indicação para o uso de probióticos (principalmente fonte de Lactobacillus, que aparecem reduzidos nessas mulheres) são possíveis intervenções que podem atuar nessas duas condições que conversam entre si.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Gruber, T. M., & Mechsner, S. (2021). Pathogenesis of Endometriosis: The Origin of Pain and Subfertility. Cells, 10(6), 1381. doi: 10.3390/cells10061381
Jiang, I., Yong, P. J., Allaire, C., & Bedaiwy, M. A. (2021). Intricate Connections between the Microbiota and Endometriosis. International journal of molecular sciences, 22(11), 5644. https://doi.org/10.3390/ijms22115644